Finitude, cuidados paliativos e luto coletivo: quando a morte se torna de todos
- SIRLEI PEREIRA NUNES
- 21 de jul.
- 2 min de leitura

Falar da morte pode ser, ainda hoje, um tabu social. Mas, quando ela se torna pública, seja pela partida de uma figura conhecida ou por eventos marcados por grande comoção, a finitude deixa de ser uma experiência estritamente individual e passa a ser sentida no coletivo. Nesses momentos, o luto se amplia e revela o quanto a dor pela perda ultrapassa fronteiras privadas.
No campo dos cuidados paliativos, o fim da vida é compreendido não como desistência, mas como uma etapa que merece ser vivida com dignidade, presença e escuta. Trata-se de um cuidado ético e compassivo, que reconhece o sofrimento físico, emocional e existencial diante da terminalidade, respeitando o desejo e a subjetividade de quem parte. O processo de morrer, quando cuidado, pode se tornar uma potente experiência de reconexão consigo, com o outro e com o sentido da própria existência.
Do ponto de vista da psicanálise, o luto é um processo necessário e singular, que visa elaborar a ausência do objeto amado. Freud, em Luto e Melancolia (1917), afirma que o luto exige trabalho psíquico: o investimento afetivo que antes estava no outro precisa, com o tempo, ser ressignificado. Quando a perda é compartilhada por muitos, como ocorre nos lutos coletivos, ela mobiliza identificações inconscientes profundas, resgata dores pessoais e nos confronta com nossa própria finitude.
O luto coletivo atua como um espelho simbólico. Ele não apenas nos entristece, mas também nos convoca a refletir sobre o valor da vida, sobre o tempo e sobre como estamos (ou não) vivendo com presença e verdade. Em muitos casos, a visibilidade do processo de morrer, quando tratado com sensibilidade, inspira transformações culturais, humaniza a morte e reposiciona o papel do cuidado até o fim.
Vivenciar e nomear o luto, especialmente em sua dimensão coletiva, é uma forma de sustentar o vínculo com quem partiu e, ao mesmo tempo, uma oportunidade de ressignificar a vida. A morte, inevitável e universal, continua a nos ensinar sobre o que realmente importa: a presença, o afeto e a capacidade de estar com o outro, até o fim.
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